Hoje, encontrei um menino
que conhecia. Tão conhecido que nunca me importei em saber seu nome. É um
menino com uma história longa e para não usar “o menino sem nome" vou
nomeá-lo. Alerto desde já, que o nome não é o mais importante. O mais importante
é seu lugar na história.
Quando tomei fôlego e coragem para perguntar seu nome, e outros pormenores mais importantes, ele se foi. Não se importou que eu soubesse sua história, não se importou em olhar para trás para falar qualquer coisa com o olhar, como qualquer pessoa desconfiada de que haja um pedaço do segredo de si com outra pessoa. Ele não me deixou um olhar, mas deixou uma história e ensinou que tão importante como ouvir e contar histórias, é descobri-las.
Quando tomei fôlego e coragem para perguntar seu nome, e outros pormenores mais importantes, ele se foi. Não se importou que eu soubesse sua história, não se importou em olhar para trás para falar qualquer coisa com o olhar, como qualquer pessoa desconfiada de que haja um pedaço do segredo de si com outra pessoa. Ele não me deixou um olhar, mas deixou uma história e ensinou que tão importante como ouvir e contar histórias, é descobri-las.
Seu nome:
Joaquin.
A realidade nunca foi um abrigo para ele. Aprendeu, entretanto, que o presente é passageiro e o atalho para as emoções incômodas nunca seria desejar seu fim, mas entender que tudo se dilui a medida que nossa ignorância não ocupa mais espaço.
Como toda criança, sonha. A criança que não sonha não pertence a este mundo, ou está doente de contaminação. Se alguém gostaria de conhecer o inferno, basta não incentivar uma criança a sonhar. O sonho é sempre um convite para realidades desconhecidas. Os sonhos são setas e canteiros, a proximidade garantida do conforto de pertencer a nós mesmos.
A realidade nunca foi um abrigo para ele. Aprendeu, entretanto, que o presente é passageiro e o atalho para as emoções incômodas nunca seria desejar seu fim, mas entender que tudo se dilui a medida que nossa ignorância não ocupa mais espaço.
Como toda criança, sonha. A criança que não sonha não pertence a este mundo, ou está doente de contaminação. Se alguém gostaria de conhecer o inferno, basta não incentivar uma criança a sonhar. O sonho é sempre um convite para realidades desconhecidas. Os sonhos são setas e canteiros, a proximidade garantida do conforto de pertencer a nós mesmos.
Encontrei
Joaquin na cidade ocupada pela realidade que impõe o mundo. Para esta, os
contornos do chão seguem linhas lógicas e as cores são sempre
previsíveis, como o ato de existir ou acreditar. Um exemplo disso é que existe
o céu sempre azul ou a água do mar é sempre salgada e sempre verde e
tudo permanece, sempre, no seu devido lugar.
Para Joaquin, quando o pensamento é hidratado pelo sonho ele nos projeta aos segredos que só as estrelas sabem. Não é magia. É Ciência. Ciência do entendimento do desdobramento das coisas. Assim ele costumava exemplificar a divindade de sua tese: Basta analisar o desdobramento do braço, ele dizia. Desdobrado, tem seu alcance muito maior: torna-se abraço. Acreditar nesta realidade (a que se desdobra) diferencia quem entende o mistério das estrelas daqueles que só acreditam nas estrelas quando o Sol se põe.
Outro pragmatismo desta ciência, cujo expoente era o Menino-luz, como eu gostava de chamá-lo, é a superior capacidade de fazer trompetes com a caixa de pasta de dentes. Nisso, sempre teve muito destaque, solitário destaque. Não quero contaminá-los com a minha tristeza neste momento e explicar o porquê do solitário destaque, entretanto, lembrei-me da máxima, dita por aquele cujo a irradiação do sorriso, a liberdade repousava luminosa: " Quando os pigmeus não alcançam os gigantes, jogam pedras para rebaixá-los".
Para Joaquin, quando o pensamento é hidratado pelo sonho ele nos projeta aos segredos que só as estrelas sabem. Não é magia. É Ciência. Ciência do entendimento do desdobramento das coisas. Assim ele costumava exemplificar a divindade de sua tese: Basta analisar o desdobramento do braço, ele dizia. Desdobrado, tem seu alcance muito maior: torna-se abraço. Acreditar nesta realidade (a que se desdobra) diferencia quem entende o mistério das estrelas daqueles que só acreditam nas estrelas quando o Sol se põe.
Outro pragmatismo desta ciência, cujo expoente era o Menino-luz, como eu gostava de chamá-lo, é a superior capacidade de fazer trompetes com a caixa de pasta de dentes. Nisso, sempre teve muito destaque, solitário destaque. Não quero contaminá-los com a minha tristeza neste momento e explicar o porquê do solitário destaque, entretanto, lembrei-me da máxima, dita por aquele cujo a irradiação do sorriso, a liberdade repousava luminosa: " Quando os pigmeus não alcançam os gigantes, jogam pedras para rebaixá-los".
Escovar
os dentes para Joaquin nunca foi uma prioridade. Preferia gastar a pasta de
dentes fazendo desenhos abstratos na pia do banheiro ou até mesmo no vaso
sanitário. A alegria consistia em desenhá-los com a ponta dos dedos ou com a
palma das mãos, poderia até juntar dois tons de pasta de dentes (geralmente
azul ou vermelho, sempre para adultos. As pastas infantis não tinham
consistência para modelagens) o que aumentaria a expectativa para a abertura de
novas caixas e o descobrimento de novos timbres e afinações, resultado da
mistura do papelão e outros processos de composição do material das caixas.
Com as caixas em mãos, o momento era celestial. Reservava um dia ou no máximo dois na semana, sempre com duas marcas diferentes. Descobriu que as caixas não poderiam ser apenas trompetes, mas, qualquer outro instrumento de sopro que desse vida ao ar dos pulmões. No quarto, voltava-se a si e ao mistério do ar. Ninguém mais entendia desta realidade.
O ar é uma coisa engraçada, contou-me ele um dia. Renova-se sendo sempre o mesmo. O ar que respiramos hoje já foi o ar respirado pelos dinossauros, pelos homens na Idade Média e até por Jesus Cristo. Mas, o ar nunca foi um coisa em si. No início do mundo o ar nunca foi ar, era uma ausente gotinha do protoplasma que hoje respiramos. O mundo sofria de falta de ar até que surgiu a música e a música foi quem deu movimento e oxigênio ao ar para dançarmos enquanto vivemos.
A moral do mundo está ligada aos timbres. Os homens se tornam bons ou maus por não dançarem conforme a música que sopra dentro de cada um. Não há um determinismo, mas a falta de música interna faz sofrer. As formigas tem a cara de framboesa e cheiro de capim cidreira porque seguem cantando formigueiro adentro, as abelhas tem a barriga do veludo de um dia de Sol porque fazem o mel cantando para os polens, e até as nuvens, antes de produzirem o suco do céu, cantam. Algumas nuvens mais animadas cantam alto e em coro, nos assustam com as melodias elétricas e a cozinha dos deuses vira uma bagunça. Uma sonora bagunça! Uma viva e fraterna bagunça!
Os dias na cidade estavam cada vez mais retos.
Há algum tempo não ouvia mais música nas cidades. Imperava o silêncio da rotina e das construções dos Dédalos modernos. Via-se corações tolos como a fúria do touro provocado nas arenas.
Com as caixas em mãos, o momento era celestial. Reservava um dia ou no máximo dois na semana, sempre com duas marcas diferentes. Descobriu que as caixas não poderiam ser apenas trompetes, mas, qualquer outro instrumento de sopro que desse vida ao ar dos pulmões. No quarto, voltava-se a si e ao mistério do ar. Ninguém mais entendia desta realidade.
O ar é uma coisa engraçada, contou-me ele um dia. Renova-se sendo sempre o mesmo. O ar que respiramos hoje já foi o ar respirado pelos dinossauros, pelos homens na Idade Média e até por Jesus Cristo. Mas, o ar nunca foi um coisa em si. No início do mundo o ar nunca foi ar, era uma ausente gotinha do protoplasma que hoje respiramos. O mundo sofria de falta de ar até que surgiu a música e a música foi quem deu movimento e oxigênio ao ar para dançarmos enquanto vivemos.
A moral do mundo está ligada aos timbres. Os homens se tornam bons ou maus por não dançarem conforme a música que sopra dentro de cada um. Não há um determinismo, mas a falta de música interna faz sofrer. As formigas tem a cara de framboesa e cheiro de capim cidreira porque seguem cantando formigueiro adentro, as abelhas tem a barriga do veludo de um dia de Sol porque fazem o mel cantando para os polens, e até as nuvens, antes de produzirem o suco do céu, cantam. Algumas nuvens mais animadas cantam alto e em coro, nos assustam com as melodias elétricas e a cozinha dos deuses vira uma bagunça. Uma sonora bagunça! Uma viva e fraterna bagunça!
Os dias na cidade estavam cada vez mais retos.
Há algum tempo não ouvia mais música nas cidades. Imperava o silêncio da rotina e das construções dos Dédalos modernos. Via-se corações tolos como a fúria do touro provocado nas arenas.
As
grandes cidades tornaram-se confidências. Rumou-se então para liberdades
confinadas e seria inútil alcançá-las a não ser bebendo refrigerantes
cor-de-mofo, fumando algumas marcas de cigarro ou apostando em empresas que
garantem o sucesso garantido e a qualquer preço. O sucesso é o inverso das
pessoas, disse-me ele um dia.
Este não
era mais o mundo de Joaquin. O Menino-luz agora era frágil como uma lamparina.
Os trompetes das caixas de dentes estavam roucos. A Música-luz perdeu seu
lugar.
Desacreditado,
procurou ajuda e apenas encontrou mãos geladas e distintas. Não conhecia mais
pessoas no mundo.
Chegou a
ir a alguns lugares com pessoas cruas que receitam coisas-promessas. Durante
uma semana, Joaquin ofereceu às caixas e a si mesmo alguns micro pedaços de
encanto.
Aconteceu
o inesperado: Os encantos, carregados de promessas, acabaram com a música de
Joaquin. Convicto de que esta não era a saída, a partir de agora seu caminho
estava aberto: sabia que nunca deveria acreditar nos sonhos de consumo ou em
esperanças que são produzidas em larga escala, embaladas e coloridas. A
verdadeira confiança repousa nas coisas silenciosas. Aquilo que faz barulho é a
porta de entrada para o abismo.
A senha
do mundo agora é dinheiro.
Joaquin
nunca dançou ao abrigo desta realidade. A realidade, como fenômeno, é aquilo
que dificulta qualquer pessoa de ouvir sua música.
Foi
quando as primeiras cordas do dia empurravam a noite fria. No caminho para a
padaria, lembro-me, foi a última vez que vi Joaquin. Neste momento, iniciei um
bom dia para continuar a conversa com o menino que rompeu o mistério do dia e das palavras.
-Bom dia,
eu disse.
Joaquin
apenas dançou.
Tudo que
fica é história e nunca mais vi Joaquin.
Se o
mundo precisa dos super-heróis, é justamente com eles que não se pode contar.
Como sempre, seus textos precisam de releitura para captarmos as sutilezas. As lágrimas que de mim saem fácil encontraram muitos motivos - bons - para não se fazerem de rogadas e visitarem minha face. E, realmente, precisamos contar é com os artesãos das palavras, com os jardineiros da música e com os cozinheiros das demais artes.
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