Para o amigo e poeta da vida Rubem Leite
O triste é que foi tudo impuro como o salto que levita. O
salto é imantado a uma lei que desconhecemos.
Eu disse triste? Não. Foi apenas uma mentira que pensava e descarrilou
minha língua, chicoteando-a. Esta é a linguagem da vida e eu a ouço. Disso você não entende, por mais que especule.
Quer saber mesmo o que penso? Sim? Então vamos lá. Mas, não me venha com assuntos
corriqueiramente manjados. Não quero saber da liberdade contingencial e
condicionada. Tire a liberdade de tudo que seja exato ou metafísico. Começamos
por aqui. Este é um generoso começo não concorda?
A noite hoje está cheia como uma grande colmeia. Consegue ouvir? Já pensou na possibilidade da existência de
vida dentro de uma xícara de café? Lembrei-me da amiga de uma tia minha. Previu
os dois enfartes do meu tio, a vinda de uma “vida nova” e uma perda na família (
referia-se a minha tia-avó, bem debilitada por sinal) em uma xícara de café. Enfim,
a coitada não descobriu é que era com o dinheiro das “consultas espirituais” que o filho, meu grande amigo, bancava o baseadinho para todo
mundo.
Está bom o café? Desculpe. Você não toma mesmo café? Pois deveria, não se deve confiar nas pessoas
que não tomam café. Deixe que eu tomo o que coloquei para você enquanto vamos
lá para fora.
Claro, na calçada mesmo. Você é mais um que não repara no chão? Pois eu
daria tudo para ouvir o que uma calçada tem a dizer. Bem, não seria uma conversa, não há igualdade
com as calçadas e o chão. O que pode haver são segredos. Unicamente segredos.
Segredos sóbrios. É isso que nos separa do chão e das calçadas: segredos.
Um segredo nunca foi sinônimo de verdade exclusiva. Isso é
papel de editor de revistas de fofoca ou diretor de novelas. Um segredo é
anunciação.
Você já pensou sobre o seu segredo? A entonação foi acidental, não me chame de
arrogante. Eu respeito seu direito de não responder, mas, guarde a pergunta. Um
segredo também é incubador de respostas.
Acompanhe aquele casal. O segredo da mulher que segura na mão
do homem, e busca sua alma, está longe do prazer. Aliás, amigo, ai daqueles que
preconizam o prazer como a sístole-diástole da vida! O prazer da mulher está em
ser silêncio e buscar o vazio. Para ela,
o homem é muito mais que um complemento. São as pessoas difíceis que enaltecem
as nossas fraquezas e ela por ser linha
e ele agulha, formam o manto. O frio, entretanto, é o que os separa. O frio é consoante, o frio é passageiro.
Poderia dizer que esta é uma realidade das grandes cidades.
Especulo apenas para você, testemunha dos meus devaneios. Para qualquer outra
pessoa, um passo além da fronteira dessas palavras seria um desperdício. O barulho, a discussão...são sempre registros
do que deveria ter ficado no silêncio. Aproveito para considerar que o barulho tem a mesma propulsão do chicote
que esfola e instiga a língua. O único veneno que paira no ar é a suspeita.
Triste realidade não?
Eu agitado? Deve ter sido o café. Nossa, acabei falando demais! São cinco horas
da manhã! Você quer mesmo ir?
Vá pela calçada mais longa, esta que segue a Avenida até o
final. Depois, siga pelos seus devaneios
fieis e encontre o amanhecer do dia com olhar raro, o olhar que não faz do dia “mais
um”.
Não ria, é serio! A loucura só é tormenta para quem não cabe
nela ou faz dela um vício.
Vou terminar de ler meu livro de Contos Espanhóis.
Eu ficarei bem, obrigado.
Caríssimo!
ResponderExcluirPrimeiro, muito obrigado pelo presente. Seu texto é simplesmente delicioso.
Eu sabia que sua prosa poderia ser, e ela se mostra, muito agradável. Tanto já sei de sua qualidade em prosa e verso que antes de ler já indiquei em duas disciplinas da faculdade Letras que estou fazendo.
Sobre o texto:
Eu ouvi o barulho da colmeia, ri em alguns momentos, como o do (palavras minhas)baseado profético... Seu convite para tomarmos café e sua desconfiança (uarrará) de que não o toma... Em todos eu refleti e como tudo que é bem feito nos convida a uma segunda leitura para pegar ainda mais nuances.
Rubão!
ExcluirObrigado pelas palavras meu bom!
Entre as tantas "dívidas" que tenho com você, foi a respeito de buscar outras formas e gêneros de expressão.
Tô arriscando!rs
Rubão!
ResponderExcluirObrigado pelas palavras!
Fiquei muito feliz pela indicação! Como sabe, ainda engatinho neste universo lírico e contar com uma pessoa como você me orientando e motivando é super importante!
Aliás, o livro de contos espanhóis é ótimo!rs
A Gabi me mostrou o caminho, me apresentou o espaço e me disse que eu iria gostar: acertou na mosca! rs Já li algumas coisas, mas volto para ler mais, porque adoro ler coisa boa! Também vou linkar teu blog lá no Roxo, para acompanhar cada postagem nova.
ResponderExcluirParabéns!
Beijos,
Fique a vontade para voltar mais vezes Tania!
ResponderExcluirObrigado pelas palavras!
\o/