sexta-feira, 14 de março de 2014

Esquina e honra


Voltemos ao tempo:
antes da organização selvagem das prateleiras
antes do cortejo dos uniformes a bater o ponto
antes da vaidade a escrever estes versos.

Em algum lugar deste intervalo
o vento implode micro-crateras no céu.
Depois
a chuva,
consolo à aridez humana,
estoura um novo rastro de destino
sentimento linear de um trem nas alturas.

O fim do ciclo é nascimento.

Do solo, a proteína
dos vegetais, a paz.

A fome da vida
é saber que ela é universal como um grão de arroz
e tudo que queima
vira lembranças
dispositivo de inaugurar nações e despedidas.

O horror foi inaugurado.

Da barriga das cidades
o rio canalizado não encontra o mar.
De toda eletricidade que pensa
escapa o mais importante:

O tempo é um gigante cínico
que sorri
enquanto corremos dele.
Quanto mais corremos
mais forte ele fica.
Quanto mais despedaçados ficamos
mais pedras de solidão ele joga.

Pelas ruas de neon
onde o céu não alcança os passos
todos dormem.

Pela televisão
todas as histórias brotam nos quartos.
Pelos carros
todos sonham aos gritos
e entopem as veias das cidades.
Todo dever religioso
é um beijo de boa noite das novelas.

Voltemos ao tempo
em que o céu
era apenas compromisso de baleias
e micro-crateras.
Não de aviões. Não de trânsito aéreo.

O tempo
anuncia com erotismo
com crueldade
com açúcar refinado
e muita gordura:
Com excelência e ganância
o futuro será
o presente do arrependimento.

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